Ministro, o carro
"brasileiro", como o Senhor sabe mais do que eu, é um dos mais caros
do mundo. Garanto, pro Senhor: não é só por causa do imposto, não. É o lucro
que é grande mesmo. Então, se alguém tem como queimar gordura pra vender mais
carro, esse alguém é a própria indústria automobilística que o produz. Diminuir
a carga tributária do automóvel beneficiando-a, apesar de à primeira vista o benefício
ser do consumidor? Indústria que já aufere lucros elevadíssimos. Não faz
sentido, não. Se as montadoras querem vender mais carros, então que
barateiem o seu produto diminuindo a margem de lucro. Que vendam, por exemplo,
o carro no país com o mesmo preço que o comercializam lá fora. Qualquer
empresário sério, quando precisa, faz isso. Então, por que a indústria de
automóveis tem de ser diferente?
Por outro lado, se as montadoras
não querem vender mais carros, até que não é má ideia, não. A gente não
pode ficar pensando como se estivéssemos em 1960 na era JK. O mundo mudou,
temos de mudar também. Sim, passou da hora de se ficar sempre imaginando
benefícios pras montadoras, porque empregam e pagam impostos. Tanta gente
emprega e paga imposto sem ajuda nenhuma do governo. Moral da estória: nem
sequer temos um carro nacional. De tal maneira, que a grana do carro desliza em
royalties preciosos pro estrangeiro cada vez mais ávido por dólar nessa
crise medonha. Quanto à mão de obra, o processo de montagem de automóveis
é por demais automatizado hoje. Greve de metalúrgicos, como as da época do
Lula, é coisa rara, porque a indústria dos carros tanto demais tem em
tecnologia, quanto de pouco tem de emprego.
Ministro, precisa-se mesmo é
pensar e por mãos à obra em transportes de massa, em navios de cabotagem
nacional, suprimir os desvios e percursos inúteis dos caminhões por estradas
que se esburacam a cada ano. Precisamos fabricar trens e ferrovias, que
trem já fazia parte da visão de D.Pedro II e do barão de Mauá. A Argentina,
desde há muito, já os tinha de ruma cortando os pampas. Trens cortando toda a
imensa Rússia foi o que de bom fez os Csares (Transiberiana
etc.) e depois o Stalin. Trens confortáveis ligando o
Canadá, de Leste a Oeste. E trens não tão confortáveis assim, ligando a
Índia, movidos pelo engenho extraordinário inglês e a gente resistente
e criativa indiana. E a China? Cada vez mais desenvolve, testa e constrói
trens de alta velocidade com tecnologia própria. Mesmo tendo a China carro
nacional pra exportar mais barato que o resto do mundo.
Metrôs? Carecemos de mais metrôs,
como o Senhor conhece bem os da Europa, que também tem, em montes, os trens
ligeiros. Tatu gigante não deve faltar pra gente cavar veloz sólidos buracos
fundos. Por que a gente não tenta fabricar os tatuzãos, como são chamados por
aqui? Tecnologia? Precisamos, isso sim, de tecnologia nacional e não é
favorecendo a indústria automobilística estrangeira que a gente vai conseguir
isso. Sim, o egoísmo do uso individual do carro tinha de estar com os dias
contados, nem ruas temos mais pra tantos carros. Se vai dar mais safanão em
pedestre pra conseguir espaço pra mais carro? Ou se vai arranjar um
jeitinho brasileiro de trepar um carro em cima um do outro?
Ministro, libere dinheiro pra
essas coisas solutivas de que eu lhe falei. Conte com a engenharia
brasileira, um país não se faz sem engenheiros e sem ciência verdadeira que
pesquisa coisa nova e reinventa, melhorando, as velhas. Monetarismo e
tributarismo têm limites. Assim, incentive e cobre dos centros de pesquisas
nacionais projetos de locomoção, de mobilidade etc. Eles lhe darão bom
retorno. Não esqueça também de fazer ciclovias, Ministro. É muito
mais democrático, bom pra economia, pro inteiro-ambiente e pra saúde. Bicicleta
é tão útil em Amsterdã como o era no Limoeiro do meu Ceará de tempos atrás. Não
se vê mais bicicletas, por aqui. Nem se vê jumento, nem cavalo. Só o ruge-ruge
das motos infernais, financiadas a perder de vista. Muito vivente opta por
elas, por questão de economia. Outros não andam de bicicleta porque carecem da
certeza de voltar pra casa vivos. Garanto pro Senhor que essas propostas
bestas que eu lhe disse aqui dão muito mais empregos do que promete lobista de
montadora fazendo beicnho pra baixar carga tributária. Pois, se a gente
mirar pro chão da fábrica dele, se vai ver que funciona mesmo é à base de
robots computadorizados vindos do estrangeiro.
George Alberto de Aguiar Coelho